sábado, 14 de julho de 2012

ARIGATÔ


Às 18h, o interfone tocou. Eu estava no quarto, afogada em rendas e espartilhos, na maior dúvida: o que vestir? Raramente entro em crises deste tipo porque só tenho no armário peças que amo, mas hoje não estava em climinha de amor: fervia de paixão. Precisava de uma lingerie que transbordasse meu rio incandescente feito barreira que se rompe com a intensidade não da água, mas do fogo. Bééép. O interfone. Era o porteiro anunciando a entrega de uma encomenda. “Encomenda?”, não fazia ideia do que se tratava. Mandei subir.

Um senhor com quepe e luvas brancas, muito sério, me estendeu uma caixa com um laço enorme de presente. “Da parte do senhor Jorge, com a sua licença”, e se retirou. Fiquei segurando o pacote, atordoada. Parecia cena de filme - diretor, qual é a minha fala mesmo? Perplexa, mas absolutamente encantada, desembrulhei o laçarote e abri a tampa. Em meio a um papel de seda finamente embrulhado, estava um conjunto de lingerie perolado, lindíssimo, com uma deslumbrante máscara de porcelana chinesa. E uma carta. 
“Minha deusa da Volúpia..”. Precisei me beliscar para acreditar que isto estava acontecendo. Imaginei aquele maxilar quadrado se movimentando lentamente, articulando letra por letra a palavra Vo-lú-pia, a mão dele tocando o meu queixo, me puxando para um beijo, ula-lá, só isso já me deixou subindo pelas paredes. Porque é assim que o Mascarado é, uma coisa máscula e envolvente que esquenta as coxas da gente. Fui degustando saborosamente cada frase, o danado é bom em todos os sentidos: além de gostoso e inteligente, escreve bem. Comecei a me abanar com o papel de carta, e não sabia se me refrescava ou lia. Que loucura!

“Vem voando pra mim”, dizia. Junto mandou um código de reserva: havia uma passagem à minha espera no guichê do aeroporto para encontrá-lo em São Paulo. Fiquei como barata tonta, pulando e rindo “NÃO ACREDITOOO!!!”, sozinha na sala. Respira, Verônica, respira. Precisava me acalmar e colocar a cabeça para funcionar. Eu tinha agendado um compromisso importantíssimo e inadiável no dia seguinte. Mas como recusar um convite de um cara tão surpreendente? Não havia muito tempo para decidir, o voo partia em três horas. Adiei. Inadiável é o dia de hoje.

Vou pular a parte do avião e de como passei a viagem inteira contando os minutos para vê-lo. E o fato do motorista dele – o senhor de quepe - ter me levado ao aeroporto e haver outro em São Paulo me esperando com flores. Pequenos detalhes, grandes efeitos. Me senti uma rainha. Que mulher não gosta de ser tratada assim? Eu amo. O Mascarado já havia dado as instruções, fui conduzia a um restaurante japonês, só tive o trabalho de sorrir e agradecer as portas se abrindo para eu passar.

Pela primeira vez na vida eu estava tremendo antes de um encontro. De medo, não de excitação, porque disso eu tremo sempre. Minhas mãos ficaram geladas, senti um frio na barriga. O que poderia dar errado? Nada. Era isso o que me deixava aflita, estava tudo perfeito demais. Enquanto seguia o maitre até a salinha reservada, coloquei a mão no coração que parecia querer saltar do meu peito. Aproveitei para puxar o decote do corpete para baixo, deixando à mostra um abismo de perdição, porque se é pra morrer de tesão, que eu leve o outro junto. Paramos ao lado de uma espécie de biombo. Eu seria capaz de escutar a respiração dele através da porta de papel. Uma vela iluminava o seu contorno ereto, afrodisíaco. Coloquei a máscara.

A porta se abriu e lá estava ele, maravilhoso, completo, abrangendo com o tórax não só o meu campo de visão, como o meu campo fértil de fantasias. Frente a frente, olhos nos olhos através das máscaras, não dissemos uma palavra. Ele estendeu a mão e me ajudou a subir no tatame. Meu sorriso ia de orelha a orelha. Não consegui evitar morder o lábio inferior – tenho esse cacoete quando estou com muita volúpia. Sentado à minha frente, ele também mordia o dele. “Estou tentando aparentar calma e autocontrole, mas você não imagina a força que preciso fazer”, sorriu. “E eu, estou conseguindo disfarçar bem?”, perguntei. Rimos.

“Vem cá”, me puxou por cima da mesa. Fui derrubando pratinhos, hashis e guardanapos, envolvida pelos tentáculos do polvo dionísico num beijo engolidor de fogo. As mãos dele percorreram o meu corpo com a audácia da carícia certeira, aquele aperto seguro, forte, de quem sabe pegar. “Que bom que você veio”, sussurrou, enquanto mordiscava o meu pescoço. “Você tinha alguma dúvida?”, perguntei, entre gemidos. “Talvez pudesse ficar assustada com a minha loucura”, falou, beijando o meu ombro. “Você é do tamanho dos meus sonhos”, respondi, com a cabeça dele entre as minhas mãos. “Verônica, estou louco por você!”, sucumbiu ao meu decote. Arigatô!

Não pense que eu fiquei toda borrada de batom porque eu não passei batom. Meus lábios carnudos são vermelhos suficiente, não precisei de retoques quando o mascarado bateu três palmas e o garçon escancarou a portinhola trazendo as bebidas. “Eu sei que você gosta de champanhe, mas quero que prove este saquê”, me estendeu um cálice com um líquido leitoso e espumante. Duas covinhas surgiram sob a máscara negra que lhe ocultava os olhos. “Hum, delícia!”, aprovei. Há quanto tempo não tomava esta variedade? A primeira e única vez foi numa degustação que fiz no hotel Astoria, em NY, há anos. Eu nem sabia que existiam saquês tão borbulhantes. Eu nem sabia que existiam homens que nos faziam borbulhar tanto.

Mais três palmas e um barco cheio de especiarias exóticas foi colocado sobre a mesa. Ali ele ficou por um bom tempo, abandonado, porque nossa fome era outra. Nunca fui fã dessa coisa de beber da boca do outro, mesmo já tendo abastecido muitas gargantas sedentas por aí. Mas confesso que o Mascarado fez de um jeito que me deixou alucinada. Eu não queria saber de outra coisa a não ser me embebedar dele. Colocou raiz forte na ponta da língua e fez um “barquinho” com ela, onde derramou o saquê. A mistura ardente do tempero com o geladinho da bebida com o quente das nossas línguas nos grudou feito cola. Sentir o volume do mastro forçando a calça me colou. Nele.

Eu estava inteiramente vestida dele. Mais do que justo ele me despir. Um trench coat italiano bege, tão somente, era tudo o que me cobria. Começou abrindo o meu cinto, depois os botões, um a um, como quem desembrulha um presente e não quer amassar o papel. Meu corpo saltou aos seus olhos como colinas convidando à cavalgada. “Você é tão linda que parece uma pintura”, suspirou. E mordeu o lábio pela segunda vez na noite. Trazia no semblante um olhar vidrado que me deixou vidrada. “Não quero tirar nenhuma outra peça, você está inacreditável”, me enlaçou e abocanhou o ossinho do meu quadril. “Quem disse que você precisa tirar?”. Ele entendeu o recado.

Soltou as presilhas das minhas meias sete oitavos, habilmente, com um par de hashis. Passou os palitinhos de leve nas partes nuas da minha pele, me arrepiando inteira. “Ahh!”, me contorci. Os laços da calcinha ele desfez com os dentes, a urgência começou a falar mais alto: jogou-a longe. Apertou minhas coxas com as duas mãos e foi me abrindo feito uma concha valiosa. Descobriu minha pérola negra. Derramou sobre ela o saquê gelado, “AHHH”, joguei minha cabeça pra trás. Com os hashis, pinçou o meu ponto G. Com a língua, me fez gemer. E, sem dó, nem molho shoyo, me jantou com três pauzinhos.

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