Às 18h, o interfone tocou. Eu estava no quarto, afogada em
rendas e espartilhos, na maior dúvida: o que vestir? Raramente entro em crises
deste tipo porque só tenho no armário peças que amo, mas hoje não estava em
climinha de amor: fervia de paixão. Precisava de uma lingerie que transbordasse
meu rio incandescente feito barreira que se rompe com a intensidade não da
água, mas do fogo. Bééép. O interfone. Era o porteiro anunciando a
entrega de uma encomenda. “Encomenda?”, não fazia ideia do que se tratava.
Mandei subir.
Um senhor com quepe e luvas brancas, muito sério, me estendeu
uma caixa com um laço enorme de presente. “Da parte do senhor Jorge, com a sua
licença”, e se retirou. Fiquei segurando o pacote, atordoada. Parecia cena de
filme - diretor, qual é a minha fala mesmo? Perplexa, mas absolutamente
encantada, desembrulhei o laçarote e abri a tampa. Em meio a um papel de seda
finamente embrulhado, estava um conjunto de lingerie perolado, lindíssimo, com
uma deslumbrante máscara de porcelana chinesa. E uma carta.
“Vem voando pra mim”, dizia. Junto mandou um código de reserva:
havia uma passagem à minha espera no guichê do aeroporto para encontrá-lo em
São Paulo. Fiquei como barata tonta, pulando e rindo “NÃO ACREDITOOO!!!”,
sozinha na sala. Respira, Verônica, respira. Precisava me acalmar e colocar a
cabeça para funcionar. Eu tinha agendado um compromisso importantíssimo e
inadiável no dia seguinte. Mas como recusar um convite de um cara tão
surpreendente? Não havia muito tempo para decidir, o voo partia em três horas.
Adiei. Inadiável é o dia de hoje.
Vou pular a parte do avião e de como passei a viagem inteira
contando os minutos para vê-lo. E o fato do motorista dele – o senhor de quepe
- ter me levado ao aeroporto e haver outro em São Paulo me esperando com
flores. Pequenos detalhes, grandes efeitos. Me senti uma rainha. Que mulher não
gosta de ser tratada assim? Eu amo. O Mascarado já havia dado as instruções,
fui conduzia a um restaurante japonês, só tive o trabalho de sorrir e agradecer
as portas se abrindo para eu passar.
Pela primeira vez na vida eu estava tremendo antes de um
encontro. De medo, não de excitação, porque disso eu tremo sempre. Minhas mãos
ficaram geladas, senti um frio na barriga. O que poderia dar errado? Nada. Era
isso o que me deixava aflita, estava tudo perfeito demais. Enquanto seguia o maitre até a salinha reservada, coloquei
a mão no coração que parecia querer saltar do meu peito. Aproveitei para puxar
o decote do corpete para baixo, deixando à mostra um abismo de perdição, porque
se é pra morrer de tesão, que eu leve o outro junto. Paramos ao lado de uma
espécie de biombo. Eu seria capaz de escutar a respiração dele através da porta
de papel. Uma vela iluminava o seu contorno ereto, afrodisíaco. Coloquei a
máscara.
A porta se abriu e lá estava ele, maravilhoso, completo,
abrangendo com o tórax não só o meu campo de visão, como o meu campo fértil de
fantasias. Frente a frente, olhos nos olhos através das máscaras, não dissemos
uma palavra. Ele estendeu a mão e me ajudou a subir no tatame. Meu sorriso ia
de orelha a orelha. Não consegui evitar morder o lábio inferior – tenho esse
cacoete quando estou com muita volúpia. Sentado à minha frente, ele também
mordia o dele. “Estou tentando aparentar calma e autocontrole, mas você não
imagina a força que preciso fazer”, sorriu. “E eu, estou conseguindo disfarçar
bem?”, perguntei. Rimos.
“Vem cá”, me puxou por cima da mesa. Fui derrubando pratinhos,
hashis e guardanapos, envolvida pelos tentáculos do polvo dionísico num beijo
engolidor de fogo. As mãos dele percorreram o meu corpo com a audácia da
carícia certeira, aquele aperto seguro, forte, de quem sabe pegar. “Que bom que
você veio”, sussurrou, enquanto mordiscava o meu pescoço. “Você tinha alguma
dúvida?”, perguntei, entre gemidos. “Talvez pudesse ficar assustada com a minha
loucura”, falou, beijando o meu ombro. “Você é do tamanho dos meus sonhos”,
respondi, com a cabeça dele entre as minhas mãos. “Verônica, estou louco por
você!”, sucumbiu ao meu decote. Arigatô!
Não pense que eu fiquei toda borrada de batom porque eu não
passei batom. Meus lábios carnudos são vermelhos suficiente, não precisei de
retoques quando o mascarado bateu três palmas e o garçon escancarou a
portinhola trazendo as bebidas. “Eu sei que você gosta de champanhe, mas quero
que prove este saquê”, me estendeu um cálice com um líquido leitoso e
espumante. Duas covinhas surgiram sob a máscara negra que lhe ocultava os
olhos. “Hum, delícia!”, aprovei. Há quanto tempo não tomava esta variedade? A
primeira e única vez foi numa degustação que fiz no hotel Astoria, em NY, há
anos. Eu nem sabia que existiam saquês tão borbulhantes. Eu nem sabia que
existiam homens que nos faziam borbulhar tanto.
Mais três palmas e um barco cheio de especiarias exóticas foi
colocado sobre a mesa. Ali ele ficou por um bom tempo, abandonado, porque nossa
fome era outra. Nunca fui fã dessa coisa de beber da boca do outro, mesmo já
tendo abastecido muitas gargantas sedentas por aí. Mas confesso que o Mascarado
fez de um jeito que me deixou alucinada. Eu não queria saber de outra coisa a
não ser me embebedar dele. Colocou raiz forte na ponta da língua e fez um
“barquinho” com ela, onde derramou o saquê. A mistura ardente do tempero com o
geladinho da bebida com o quente das nossas línguas nos grudou feito cola.
Sentir o volume do mastro forçando a calça me colou. Nele.
Eu estava inteiramente vestida dele. Mais do que justo ele me
despir. Um trench coat italiano bege,
tão somente, era tudo o que me cobria. Começou abrindo o meu cinto, depois os
botões, um a um, como quem desembrulha um presente e não quer amassar o papel.
Meu corpo saltou aos seus olhos como colinas convidando à cavalgada. “Você é
tão linda que parece uma pintura”, suspirou. E mordeu o lábio pela segunda vez
na noite. Trazia no semblante um olhar vidrado que me deixou vidrada. “Não quero
tirar nenhuma outra peça, você está inacreditável”, me enlaçou e abocanhou o
ossinho do meu quadril. “Quem disse que você precisa tirar?”. Ele entendeu o recado.
Soltou as presilhas das minhas meias sete oitavos,
habilmente, com um par de hashis. Passou os palitinhos de leve nas partes nuas
da minha pele, me arrepiando inteira. “Ahh!”, me contorci. Os laços da calcinha
ele desfez com os dentes, a urgência começou a falar mais alto: jogou-a longe.
Apertou minhas coxas com as duas mãos e foi me abrindo feito uma concha
valiosa. Descobriu minha pérola negra. Derramou sobre ela o saquê gelado,
“AHHH”, joguei minha cabeça pra trás. Com os hashis, pinçou o meu ponto G. Com
a língua, me fez gemer. E, sem dó, nem molho shoyo, me jantou com três
pauzinhos.
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