Fenomenal: raro, singular, extraordinário, admirável,
formidável, espantoso, assombroso, surpreendente, gigantesco, descomunal.
Fiquei em dúvida sobre qual sinônimo pescado no dicionário usar, usei todos. A
casa do mascarado nos Jardins, em São Paulo, era algo como ele: indescritível.
A entrada era camuflada por plantas, muitas plantas, mal se via a fachada. Mas
quando os portões de madeira maciça se abriram, revelaram um verdadeiro Jardim
do Éden, com esculturas aqui e ali e uma pontezinha linda que cruzava um
pequeno lago com uma fonte levava a um recanto com redes e futons sobre
estrados. Foi ali que nos instalamos.
A noite estava agradável, uma brisa soprava fininho, daquelas
que não mata de frio, mas arrepia a pele. A lua espiava entre nuvens e, além
dela, duas tochas eram tudo o que iluminava o ambiente. Uma música tribal,
densa, excitante, amornava o ar. Despojado, ele tirou os sapatos e, com os pés
descalços, se dirigiu a uma mesinha de canto onde havia uma bandeja com bebidas.
Voltou com dois cálices pequenos. Olhei para aquela imagem, Deus grego
mascarado de calça cargo e camisa cheia de amarras, entreaberta no peito,
sorriso e covinhas convidativos, vindo em minha direção. Suspirei. Ele parou no
meio do movimento e, depois de alguns segundos me contemplando, disse: “Nunca
vou esquecer este momento”. Tirou as palavras da minha boca.
“Vinho de ameixa, espero que você goste. Eu trouxe da China”,
anunciou. Sentou-se ao meu lado e me estendeu um cálice com ameixas secas dentro.
Quando fui pegar, puxou de volta, me provocando. Chegou mais perto e me deu na
boquinha. Deixou escorregar o líquido docinho e quente pelos cantos dos meus
lábios e começou a me passar a língua suavemente, alternando com beijos em
volta da minha boca, beijos cheios de vontade, para novamente abrandar e me
mordiscar de mansinho. “Aaah!”, exclamei baixinho. Contive meu impulso de
agarrá-lo. Ele estava no comando. A mim só cabia acatar. E aproveitar.
Às vezes, uma atitude submissa enlouquece muito mais os
homens do que uma pró-ativa. Ele quer arrepiá-la com gelo, cera de vela, penas
de ganso? Fique paradinha. Não tente ser mais criativa que ele ou mostrar que
você também pode enchê-lo de tesão com técnicas e performances mirabolantes.
Esqueça. Quando um homem nos dá uma ordem implícita ou explícita, na cama, ele
só quer uma coisa: que você obedeça. Ele quer brincar? Seja o brinquedinho
dele. Quer montar e desmontar, quer abrir e fechar você? Submeta-se. Não
interfira neste momento macho-dominador, neste ímpeto de subjugar a fêmea, de
mostrar que é que manda no pedaço. Deixa ele achar que é ele. Melhor: faça-o
ter certeza disso.
Nossas línguas se encontraram. Foi de repente e a culpa foi
minha. Um toque fugidio, inesperado, um reflexo involuntário da minha parte não
esperou a ordem dele para avançar o sinal. Recuei instintivamente, minha
máscara de porcelana chinesa quase caiu do meu rosto. Senti os dedos dele
subindo pelo meu pescoço, uma mão espalmada me puxou firme, cabelos, nuca,
cabeça, e uma língua sedenta, sôfrega, selvagem, acabou com o meu recato. Um
líquido viscoso e morno escorreu no meu decote, espartilho adentro, e encontrou
o meu umbigo, não sei como. “Adorei...”, me sugou o colo, “...o vinho”, derramou
mais um pouco entre os meus seios comprimidos que, lentamente, foram respirando
ao ar livre conforme o corpete ia sendo aberto.
Uma lufada forte de vento balançou a chama das tochas e
interrompeu nosso delírio. O céu tinha fechado e nuvens negras trouxeram um
temporal. Quanto tempo ficamos ali entregues um ao outro? Definitivamente, esse
homem me tira de órbita. Bem que eu senti uns arrepios, mas não me passou pela
mente que pudessem ser de frio - havia tantos outros motivos!
“E agora?”, ri, colocando a mão numa cascata que caía do telhado.
Eu estava nua em pêlo, tremendo com as sensações que a água me provocava. Meus
bicos, intumescidos pelo vendaval gelado acenderam uma lareira dentro do
mascarado. Vi quando a tora dele crepitou. “Vira”, sussurrou no meu ouvido.
Virei. “Empina”, arrebitei o traseiro. Ele prendeu fogo. E o meu banho tão
merecido depois de tantas lambidas e licores, foi tomado, por dentro e por
fora, com esfregão de aço.
A casa circundava o jardim em forma de “L”. Tinha dois
andares para cima, com sacadas, e muitos para baixo, que iam se debruçando uns
sobre os outros, com ambientes em desníveis até um segundo jardim onde uma
piscina aquecida, cheia de charme, invadia o interior da residência como o
olhar de um cão servil esperando afago. Tirei a máscara e dei um mergulho
revigorante enquanto o mascarado foi buscar roupões e toalhas. Ah, que delícia!
Antes da volta dele, tornei a ocultar a minha identidade. Luzes indiretas
estrategicamente espalhadas deixavam o ar romântico e convidativo.
Confesso que essa coisa da máscara começou a me incomodar.
Não pelo mistério envolvido, porque isso continuava um tesão. Mas pela falta de
praticidade e desconforto. Ele parece ter lido os meus pensamentos. Não sei bem
de onde, puxou um tecido lindo com estampas de dragões orientais e falou:
“Comprei no Mercado da Seda em Beijing pensando nesta
noite”, sorriu malicioso. Esperei para ver onde ele queria chegar. “Que tal
você trocar a sua máscara de porcelana por, digamos, uma mais confortável?”, esticou
o pano formando uma venda. Ula-lá! Era tudo o que eu queria.
Vendada, totalmente entregue, fui
conduzida a uma espreguiçadeira, creio eu, ou talvez fosse um divã. O móvel
tinha dois braços de madeira, dois apoios, assim, dos lados. E era bem comprido
- consegui me deitar quase inteira sobre ele. “Uau, queee momento”, ouvi meu
amante suspirar. Ordenou: “Ajoelha aqui”, ajoelhei. “Inclina mais, isso, aí
está bom”, passou a mão pelo meu corpo. Um pulso, ele amarrou alto, à esquerda,
o outro, à direita. Fiquei presa, nua, de quatro, absolutamente vulnerável.
“GOSTOSA!”, exclamou. Gostosa e encharcada de tesão.
O mascarado fez o que quis comigo.
Mandava rebolar, eu rebolava. Mandava eu me abrir, me abria. Afundar, afundava.
Sugar, sugava. Engolir, engolia. Me fez de gato e sapato e como eu gostei. E
como me contorci e urrei e gozei. Eu era a deusa dele e ele o meu cavalo alado.
Quando nossa aventura pelos campos dos sentidos terminou, exausto, meu
garanhão, me fazendo um cafuné sem fim, disse: “Vou te sequestrar uma
semana!”, e riu. Rimos. “Estou falando sério, não vou deixar você ir embora”,
me estreitou nos braços. “Uma semana? Você está louco, não posso ficar todo
esse tempo aqui”, respondi, me aninhando no peito dele. “Por que não?”,
rebateu. É vero... Por que não?
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