Fui num clube de swing. Não sou grande frequentadora desses
lugares, mais por falta de par do que por falta de vontade. Sai injustamente
caro ir sozinha: o dobro do que custa a entrada de um casal. Infelizmente, nem
sempre encontro alguém com a cabeça aberta o suficiente para me dividir com
outros, ao vivo e a cores, numa boa. Mas sexta passada era aniversário do
Artur, amigo bem íntimo, daquela turma libertina que já comentei e ele resolveu
comemorar em grande estilo. Estavam todos lá: o Duda, a Nina, a Bebel, o John,
a Silvinha, o Hugo e, claro, vários outros casais assíduos da casa. Eu não
podia faltar.
Cheguei sozinha, o que não é muito legal. É, digamos, uma
falta de respeito para com os outros. Mais ou menos como ir numa praia de
nudismo e não tirar a roupa. Você passa duas mensagens: uma, que está com
vergonha – e se tem vergonha, o que faz numa praia naturalista? Caso contrário,
só pode ser por curiosidade – o que também desagrada aos nudistas, que não
estão despidos para se exibir e sim como filosofia de vida, para se integrar à
natureza. Conhecendo as regras, pedi desculpas à hostess. Expliquei que o meu
delicioso par só chegaria mais tarde e que não queria perder o show de
strip-tease das 21h - o que era a mais pura verdade.
O show começa pontualmente nesses locais, ninguém está ali
para perder tempo. É uma espécie de aperitivo, uma lenha à fogueira da libido
que estala e se retorce de vontade antes de pegar fogo. E tinha para todos os
gostos: um mulherão daqueles de tirar o fôlego vestida provocantemente começou
o ritual sensual para o delírio da ala masculina. Foi tirando camada após
camada de roupa enquanto enfeitiçava a plateia com sua dança envolvente, caras
e bocas convidativas, respiração ofegante, proximidade ofertante e proibitiva.
Você podia vê-la, querê-la, possuí-la com a imaginação. A mão do Duda, ao meu
lado, subiu num impulso quando ela chegou pertinho, louco para apalpá-la, mas
lembrou-se que era proibitivo e a abaixou. Outra coisa, ao contrário, com
certeza ele não impediu que apontasse firme para a lua.
O segredo de um bom strip-tease mora nas entrelinhas. O
sucesso da performance depende muito mais do que o que você não mostra, insinua,
do que o que você expõe. Você finge que vai tirar a calcinha, mas não tira.
Puxa para o lado, pra cima, exibe o vislumbre do paraíso para, em seguida,
jogar a pessoa de volta à realidade, à espera de um próximo momento divino.
Você desabotoa o sutiã e na hora “H”, vira de costas. Você chupa o dedo
indecentemente. Se esfrega, se apalpa, rebola, geme. Não tira os olhos do
admirador. E quando você desenrola a luva ou a meia lentamente e joga em cima
dele está dizendo “já, já, vou te dar muito mais”. Ele espera feito um
cachorrinho que sabe que vai ganhar o osso ao se comportar. E você, boa dona,
dá mais que o osso: dá a carne.
Strip-tease tem a ver com poder. O espectador é impotente
diante do objeto de desejo, ele só pode ir até onde o outro deixar, só pode ver
o que o outro mostrar, não pode tocar, não pode matar a vontade latente. Caso
contrário, se fora às vias de fato, não é strip, é sacanagem. Por isso o
feitiço: todo homem gosta de ser dominado quando sabe que vai ganhar o jogo. É
um momento em que ele fantasia, fica pensando: “Ah, quando eu pegar você, vai
ver o que é bom”. Ali, subjugado, ele arquiteta subjugá-la. Ali, de quatro, ele
sonha cavalgá-la. Ele é o super-homem. Ele não pode nada, mas pode tudo. É a
dança do acasalamento, com a vantagem dele não precisar suar, nem competir com
outros. Não conheço nenhum macho que não goste de uma dança exclusiva da sua
fêmea antes do início do fim.
Um deus grego entrou no pequeno palco, assim que a deusa
saiu. Não sei de quem gostei mais, mas o próximo é sempre melhor do que o que
já passou, não acham? Eu acho. Ele estava vestido com uma túnica da Idade Média
e surgiu segurando duas velas acesas, uma em cada mão. Não dava para ver seu
rosto, mas o contorno da roupa denotava um volume dorsal daqueles que a gente
abraça gostoso e ainda sobra um bom naco de carne. A música vibrava, tum, tum,
e fazia tremelicar corações, entre outros órgãos mais safadinhos. A cena me
hipnotizou.
Ele soltou as velas no chão e foi tirando a capa bem devagar.
A luminosidade refletida em sua pele brilhosa me deu vontade de escorregar por
cima para ele resvalar pra dentro de mim. Devo ter soltado faíscas, fogos de
artifício, algum sinal externo porque, no meio de tanta gente, ele me escolheu
para fazer sofrer. Eu estava sentada virada para o palco com as pernas
levemente afastadas. Ele parou na minha frente e se ajoelhou, apoiando nas
minhas coxas, grudando nariz com nariz. Fiquei imóvel, feito uma cobra
esperando o próximo movimento do oponente. Olho no olho, respirações ritmadas.
E quando ele leu que podia dar o bote, fui eu quem dei, descolando um beijaço
daqueles! Esse é outro grande barato do strip-tease: o sinal verde é
dado sem palavras.
A terceira e última apresentação da noite foi com os dois
juntos: Eros e Afrodite arrasando os nossos corações. Eles devem atuar há muito
tempo juntos, porque a sintonia era total. Foi como ver um ato sexual ao vivo,
sem absolutamente nada explícito a não ser uma sensualidade de outro mundo. A
essa altura, quem não ficou em ponto de bala com os dois shows anteriores –
coisa pra lá de improvável -, com este foi às alturas. Cheguei a ficar com um
tic nervoso no maxilar, pronta para abocanhar o que quer que cruzasse à minha
frente ou comigo. Em meio a esse clima eletroestático, eis que uma mão toca o
meu ombro e uma voz máscula sussurra ao meu ouvido: “Cheguei”.
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