Fui convidada para um jogo de pôquer na casa do Júlio. O Júlio, marido da Betinha, minha amiga desde a adolescência. A casa é do Júlio porque eles são um casal moderno: cada um tem o seu canto. Moram separados e dormem juntos sempre que estão a fim ou quando um adormece em frente à TV do outro. Não encontrarem-se todos os dias foi uma maneira de preservar, mais que as manias e individualidades, o amor. E atiçar o fogo da paixão. “Quando eu vou ver o Júlio, me produzo toda, coloco minha melhor roupa, a mais sexy lingerie, me perfumo toda”, conta Betinha. “Ele sempre me agarra como se estivesse me vendo pela primeira vez”.
O Júlio e a Betinha têm uma regra: nunca se vêem aos domingos. Aos domingos, eles fazem o que quiserem com quem acharem que devem. Se der vontade, um conta para o outro na segunda-feira. Se der vontade. Caso contrário, nenhum dos dois entra em crise. “Eu só conto quando rola um caso extraconjugal daqueles bem picantes. O Júlio pira de tesão. Me chama de vadia, me xinga, depois me enche de beijos. Ele adora detalhes, por isso sempre incremento, aumento, invento. Porque você sabe, para alguém chegar aos pés do amorzão, só mentindo um pouquinho. Meu marido é perfeito”, confessa sorrindo.
Pois o meu telefone tocou justo num domingo. Era o Júlio. Sem a Betinha. Não arregale os olhos. Se os dois não entram em crise, porque eu vou entrar? Nossa história é antiga, não ia ser a primeira vez. Desde a faculdade, vivemos um triângulo amoroso com altos e baixos. Às vezes ficamos tempos sem nos ver, de vez em quando encontro só a Betinha, outras épocas só o Júlio. Confesso que prefiro quando rola um ménage à trois. Entrar de convidada na festa íntima de um casal é a melhor coisa do mundo. Pronto, agora pode arregalar.
Aceitei o convite, claro. A tarde estava chuvosa e um joguinho de pôquer sempre vem a calhar. Eu não sei jogar pôquer, mas isso não foi um empecilho. Nada como um professor dedicado para o sucesso de um aluno. Um professor, não, vários: o Júlio, o Gilson e a Silvinha. Os três ali, inteirinhos, à disposição para tirar muito mais do que as minhas dúvidas. Ulá-lá!
As apostas podiam ser feitas em dinheiro ou em peças de roupa - essa exceção eles abriram para mim. Eu tinha que deixar uma peça sobre a mesa para cada pacote de fichas – uma espécie de empréstimo bancário erótico. E outra peça quando perdesse a rodada. É claro que eu estava preparadérrima com um espartilho rendado, presilhas em forma de coração, meias sete-oitavo, saltos-agulha (amo, amo!), sedas deslizantes e muita empolgação. Adoro pessoas criativas e ali estava um grupo respeitável. Respeito é bom e eu gosto.
Para retribuir a tamanha hospitalidade, contribuí com uma sugestão singela: se o tesão apertasse, eles também poderiam pagar pra ver. Então eu ofereceira um aperitivo sacana: deixaria à mostra o bico do seio, o pé (o Gilson é podólatra), distribuiria beijos, o que eles quisessem. Mas aí, eu ganhava a rodada. Toparam. Foi quando o jogo começou a esquentar pra valer. Porque a Silvinha adorou a idéia e quis entrar na onda. Ainda não falei da Silvinha?
A Silvinha é a bonequinha mais lindinha desse mundo. Narizinho arrebitado, cinturinha fina, peitinhos-pêra. É do tipo mignon e tem uma penugem amarelinha sobre o corpo que a faz parecer sempre dourada. Tem uma boca que enlouquece a ala masculina, que faz fila pelo seu famoso poder de sucção. É do tipo angelical, loirinha, olhos cor de esmeralda e está sempre pronta para uma grande sacanagem, desde que não envolva tapas, beliscões, arranhões, mordidas, essas coisas doloridas que, vez que outra, são boas para revigorar o espírito e ativar a circulação. A Silvinha não curte. Ela é devassa, mas é um anjo.
Eu já conhecia a fama da Silvinha. Mas nunca havia tido o prazer de conhecê-la até esta tarde. Foi um enorme, um enorme prazer. Ela estava com um vestidinho floreado, levemente decotado, num certo recato. Mas quando foi até a cozinha buscar uma jarra de refrescos e expôs as costas nuas, levou a galera ao delírio. A mim, inclusive. A coluna dela não mexe: desliza feito serpente. E o decote das costas deixava o cofrinho à mostra. Fui à loucura. Eis uma mulher que sabe rebolar. Em certas horas, saber rebolar é uma carta na manga. Ali no jogo, foi.
Perdi, perdi, perdi. Perdi a concentração e três jogos consecutivos logo no início da primeira rodada. Fiz beicinho, não por ter que tirar a roupa – me exibir me agrada muito – mas porque gosto é de ganhar. No meu íntimo, eu estava querendo pagar pra ver os peitos daquela coisinha graciosa sentada à minha frente. Mas mantive o bom-humor, cumpri meu papel direitinho. Deixei meu casaco, o cinto que prendia o meu vestido e a calcinha sobre a mesa. O Gilson, que estava vidrado em mim e me queria mais que dinheiro, deu as cartas. Eu não dei nada, mas perder me deixou com sede. A Silvinha prontificou-se a servir o meu copo. Veio com o refresco na mão e, antes de me entregar, me deu um beijo profundo. “Solidariedade feminina”, sorriu. Azar no jogo, sorte no amor.
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