Combinamos de nos encontrarmos num motel, em duas horas.
Quase não precisei me arrumar – estou sempre pronta para uma deliciosa
sacanagem. Mas tirei do armário uma relíquia que eu trouxe de Paris para
momentos especiais: um conjunto de lingeries negras, rendadas, com espartilho
vitoriano, presilhas de prata e tudo o que tenho direito para incrementar o
strip-tease alucinante com o qual eu presentearia Jotabê pela coragem de
embarcar nessa louca fantasia. Vou ser para ele, esta noite, tudo o que eu
imagino que ele quer que eu seja. Selvagem, mas feminina. Sedutora, mas
delicada. Pró-ativa, mas totalmente disponível. Ele me imagina uma deusa, mas
vou ser bem mais que isso: serei uma deusa apalpável.
Coloquei um vestido de seda curto, vermelho, cujo comprimento
da saia se alinha com a barra das meias 7/8. Quando eu rebolo a saia ondula
levemente, o suficiente para mostrar, num relance, o início da cinta liga, só
para, em seguida, devolver as minhas coxas aos mistérios profundos em que elas
se revelam e desvendam. Não passei perfume algum. Quero que ele se impregne do
meu cheiro. Prendi os cabelos desajeitadamente e ficaram caindo em cascatas rebeldes.
O salto agulha não poderia ser outro. Já a máscara, escolhi uma em forma de
“mulher-gato”, que deixou à mostra meus lábios carnudos, bem sensuais. Eu tinha
outras, mas essa casou direitinho com meu instinto felino de hoje. Uma coisa,
assim, gata no cio.
Saí pela portaria abafando. Adoro testar meus looks com os porteiros do prédio. Se
eles demoram mais de cinco segundos para responder aos meus cumprimentos é
sinal que estou arrasando. Se, ao contrário, levantam num susto e gaguejam
atrapalhados “Bo-boa noite do-dona Verônica”, estou no mínimo gostosa. Esta
noite era o Damião de plantão. Ele se ergueu atabalhoado, mas não conseguiu
articular uma palavra, boquiaberto. Ficou me olhando petrificado. Ótimo. É esse
o efeito que quero causar no Jotabê.
Cheguei bem antes do combinado. Abri minha maleta de
acessórios. Uau! Parece até coisa de profissional do sexo. Taí, acho que sou
isso mesmo, com a diferença de que dou por prazer, não por dinheiro. Não que
nunca tenha dado por grana. Uma vez eu dei, entrei na pele de uma garota de
programa. Foi bem divertido, outro dia eu conto. Mas dessa vez, a coisa era
séria.
Eu estava tão excitada com a ideia de transar com um íntimo
desconhecido que mal conseguia
riscar os fósforos para acender as velas perfumadas de sândalo que espalhei
pelos cantos da suíte. Liguei a banheira de hidromassagem, coloquei sais e
pétalas de rosa - adoro flores, sempre tenho um arranjo em casa, acho que elas
dão vida à vida, são superfemininas: se abrem para receber o sereno da noite e
os orvalhos da manhã. Tudo a ver comigo. E para finalizar, baixei a luz até um
grau de penumbra. Ficou um clima perfeito. Liguei o som.
Os minutos valsavam. Estourei um champanhe. Todo o ritual
começa com um ato simbólico. O meu é um gole de champanhe, uma espécie de
brinde a mim mesma. Fico lambiscando os lábios e adoçando o paladar para ir
exercitando a língua e calibrando as vontades. E talentos. Admirei meu corpo
junto ao espelho e sorri ao ver que esqueci de colocar a calcinha - de
propósito. Diante de tanto preto e vermelho, achei que a marquinha branca do
meu biquíni, minúscula e conquistada com tanto carinho, desenhada como uma
tatuagem na minha carne rija e bronzeada de sol, valeria a pena exibir. Passei
um gelo sobre ela e no meu ponto G. Parei. Não queria o meu tesão só pra mim
hoje.
Um barulho de carro me fez estremecer. Vesti a máscara, virei
de costas e fiquei esperando, com o coração disparado, a mil. Cada segundo era
um abismo de tempo. A porta fez clic
e um longo silêncio condensou o ar. Eu estava curiosíssima, mas não sei por que
não conseguia me desvirar e encará-lo. E se ele não fosse como eu estava
imaginando? Espiei-o através do espelho. Não era nada do que eu esperava. Era
muito melhor! E estava segurando um bouquet. Um bouquet de lindas rosas
vermelhas.
Seria previsível demais ele ir vestido de Zorro. Mas foi.
Assim como seria previsível demais eu ir vestida de mulher-gato, e lá estava eu
ronronando. Nossa mútua previsibilidade foi apenas um dos indícios de que
tínhamos mais do que fantasias em comum. Sorrimos e nos aproximamos. Estendi a
mão como uma lady. Ele era alto, mais alto do que o meu salto dez, e tinha uma
das coisas que mais me deixam alucinadas por um homem: o maxilar quadrado.
Tenho um tesão danado em machos com cara de machões. Uma coisa rude, com barba
por fazer. E tinha covinhas!
Fez graça: tirou o chapéu, fez um galanteio, me olhou de cima
a baixo e, com um suspiro que mais me pareceu uma bela tomada de fôlego, disse
“não sei nem por onde começar”. Inesperadamente, ou talvez eu estivesse mais do
que esperando, me enlaçou com o chicote e me deu um beijo guloso, daqueles que
a gente se derrete inteira. Não sei como, não lembro bem, quando abri os olhos
já estava na cama. Meus planos de fazer um strip, mulherão selvagem, aquela
coisa toda, foram por água abaixo. Quem estava mandando na parada era ele – e
eu estava adorando!
Foi tirando peça por peça, lentamente, mas não numa sequência
lógica. Meu vestido se foi junto com as ligas. Então, parou e ficou hooooras
beijando meu espacinho de coxa entre a meia e o meio, me lambendo, acariciando,
me admirando, pedindo para fazer poses, para eu me exibir pra ele. Entre uma
tomada de ar e outra, dizia “nooossa!”, e era como uma palavra mágica que
acendia um fogo ardente, ele vinha com tudo pra cima, pra dentro, pra fora, pra
dentro... E quando eu estava quase desfalecida de prazer, parava e tirava outra
peça de roupa. E me engolia, me abocanhava, me mordia. E eu miava.
Não tiramos as máscaras em nenhum momento. Isso foi uma
pimenta a mais no que já estava pra lá de picante. As mãos dele percorriam
minhas curvas como se já realmente me tivessem explorado mil e uma noites.
Sabia pegar, apertar e, principalmente, onde pegar e apertar. Confesso ter
ficado impressionada. Muito raro um entrosamento milimétrico assim, de
primeira. Ele dizia que eu era perfeita, eu pensava “que cara perfeito”. Ele
dizia que estava louco por mim, eu pensava “que maravilhosa loucura”. Falou que
nunca ficou tão excitado, que podia morrer ali, que morreria feliz. “Pois eu te
quero bem vivinho”, sussurrei. Sorrimos. E a noite, que parecia nunca acabar,
estava só começando.
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